quarta-feira, 25 de agosto de 2010

O voto é na performance. E ela é quase sempre muito ruim.

Jogar o jogo é a desculpa que inventamos para os políticos e nós mesmos. É o remédio para suportar o fato de que não votamos nos candidatos, mas nas suas habilidades discursivas na mídia. E “habilidades” é uma expressão que dá mais dignidade a ação do que ela merece.


Desde o megaloi moloi dos gregos (mais do que grandes feitos, ser capaz de dizer grandes palavras!) a performance é fundamental em qualquer situação de mediação social.

O problema é que o dispositivo da mídia foi tão interiorizado pela sociedade que às vezes esquecemos que ele existe. Deixa de ser uma ponte entre a gente e a “realidade”.

Mas a ponte não fica invisível. Não é que o público despreza que há mecanismos, protocolos, ações, discursos que são SÓ da mídia e de mais nenhum mundo reconhecível ou palpável.

É que, inundado das lógicas da mídia, o público cansa de tentar depurar a mediação. Sabemos que estamos vendo um filme, que o sujeito que leva uma facada é um ator e que a nave espacial é um efeito holográfico; mesmo assim, nos assustamos, torcemos, vibramos como se fosse de verdade. Atravessamos a ponte de olhos fechados, editando o tempo que passamos sobre seu chão e ligando, no imaginário, uma margem a outra como se nada estivesse entre elas.

Não é ignorância ou hipnose. É puro cansaço.

Esse fingimento é fruto, também, de carência. Pois o filme eleitoral é muito ruim.

Somos assaltados tantas e tantas vezes pelo cinismo que ele deixa de ser exceção. Ora, a propaganda dos partidos políticos na TV é insultante; a falta de discurso consistente é flagrante; a diferença entre os candidatos é... nenhuma! Mas, esse é o jogo. Queremos acreditar que, por detrás da performance – regulada por algum instinto marqueteiro inquestionável –, existe realmente posicionamento, liderança, inteligência e honestidade, qualidades que a lógica da publicidade abomina e, portanto, elimina do espaço público midiático.

Uma das conseqüências de aceitarmos pacificamente os protocolos publicitários da campanha é esperar que um político seja apenas um “representante” dos seus eleitores. Daí soar legítimo que equipes de pesquisadores, a serviço dos partidos mais relevantes, descubram “o que público quer ouvir” para ajustar o discurso de seus candidatos.

Ou seja, um candidato é bom desde que seja uma mistura pastosa de uma suposta concordância nacional (ou regional) sobre assuntos fundamentais da vida. Mas, como tais temas são capazes de nos entusiasmar ou derrubar na mesma intensidade, é melhor nem se posicionar sobre eles.

Por isso qualquer candidato vai dizer só aquilo que o senso comum reconhece como bonito ou bom, sem entrar em muitos detalhes nem levantar dúvidas.

Isso não é política.

Isso é propaganda de margarina.

Um político ideal precisa ser líder. Isso significa, muitas vezes, enfrentar seu eleitorado, debater com as pessoas que representa. Eu não voto em alguém que concorde o tempo todo comigo. Isso seria delegar ao deputado, senador, governador, presidente uma tarefa burocrática: “vá lá e preencha a ficha”. Algo que equivale à época que minha mãe me dava uma carteira de cigarros vazia para eu mostrar ao dono da mercearia e, assim, não errar na compra.

Eu precisaria me manter nos cinco anos de idade mental para aceitar essa tarefa.

Pois é o que a campanha eleitoral faz com seus candidatos. E que a gente aceita, não por debilidade mental, diferença de classe social, acesso a internet ou vaso sanitário.

Todos nós, pobres e ricos, homens e mulheres, jovens e velhos, aceitamos essa história porque ninguém briga com comercial de margarina.

3 comentários:

  1. Ahh sortudos os que tem aula com você durante o período eleitoral!
    ahh eu não brigo com o comercial de margarina... mas me sinto uma alienígena por não concordar com qualquer candidato.... e infelizmente tenho que aceitar, pois a vida é como ela é... brigar sozinha e ter um mundo contra você? só se for para afastar "pessoas inúteis".

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  2. Vanuza! Mas uma coisa é certa: precisamos falar sobre esses incômodos. Isso não é ranzinice ou falta de amor nas diversas partes do corpo. É obrigação profissional, faz parte do "contrato" de quem optou pela profissão. Senão naturalizamos a idéia de que um bom ambiente é ausente de desacordo. Um beijo.

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  3. Grande Victor. Parabéns pelo Blog, um excelente espaço de discussão muito bem delineado, e como sempre, polêmico. Adorei seu texto, principalmente a frase: "Isso não é política. É propaganda de margarina". Como enfatizo no Marketing, a Comunicação é uma de suas ferramentas, mas não se pode menosprezar o produto, no caso, o Candidato. Um abraço, MPublio

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