quarta-feira, 30 de março de 2011

Filmes que gostaria fossem meus, parte 2

Chinatown
(Polanski, 1974)

Polanski corta o nariz de Nicholson e sentimos mais do que se víssemos os 300 de Esparta sucumbindo no fio da espada. Claro, o filme é brilhante porque tem aquele crescendo de angústia, o tabu explicitado, a Chinatown do título que só faz algum sentido nos últimos minutos. Mas o que me comove, de verdade, é uma sensação de lentidão dos sentidos, assolados pelo calor infernal de uma Califórnia cheia de silêncios significativos. E é um filme de detetive, assunto sobre o qual ainda escreverei algo mais consistente.



Glória feita de sangue
(Paths of glory. Kubrick, 1957).
Embora goste muito de 2001, o Iluminado e um ou outro, não sou um devoto do Kubrick. “De olhos bem fechados”, por exemplo, é um exercício de afetação, mais kitsch que um show do Yanni no restaurante Madallozo. Para mim, ele é um misógino – e não que seja impossível um cara que odeia mulheres fazer bons filmes, mas a coisa toda já parte de uma sensibilidade diferente da minha. Kubrick é um nerd megalomaníaco com filmes auto-centrados demais, pomposos demais. Esse “Glória feita de sangue”, obra de juventude, é maravilhoso, mesmo assim, mesmo com uma única mulher em cena, na última, representando nada mais que o sofrimento. O roteiro é preciso e não há um plano cuja vaidade nos constranja. Kirk Douglas no que tem de melhor.


Laura
(Otto Preminger, 1944).

Não é só Hitchcock que nos puxou o tapete, matando a mocinha antes da metade do filme. Antes dele, “Laura” tem outra surpresa, deslocada na nossa predisposição para enredos. Além de “Psicose”, Preminger acabará dialogando, no futuro, com mais uma obra-prima do diretor inglês, “Um corpo que cai” e talvez aproveitando sussurros do primeiro Hitchcock americano, “Rebbeca”. Nesses todos, há um fantasma translúcido na cabeça dos protagonistas, vivo e imóvel, olhando eternamente para o mesmo lugar, se apagando aos poucos nos retratos que sobram. Desde o primeiro plano, com a câmara explorando as camadas de mistério entre os objetos de cena, esse drama policial nos leva maliciosamente para conclusões erradas.

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