terça-feira, 29 de março de 2011

Projeto para a iniciação científica

Projeto:
Estratégias discursivas individuais de “contrabando” no espaço midiático

Proponente:
Professor pesquisador Victor Emanoel Folquening do curso de Jornalismo da UniBrasil (jornalista, mestre em Ciências Sociais Aplicadas, bolsista-Capes no doutorado em Ciências da Comunicação da Unisinos).

Resumo:
A finalidade da pesquisa proposta para o projeto de Iniciação Científica é, em primeiro lugar, mapear referências e abordagens na produção acadêmica brasileira sobre a relação mídia e religião; os resultados do trabalho servirão para a construção de um quadro referencial em função da detecção dos indícios de estratégias discursivas de atores individuais na mídia brasileira.

1. Hipóteses norteadoras
Eis aqui uma tentativa de síntese das preocupações temáticas e metodológicas que animam a proposta de pesquisa.
1.a Religião e mídia
Ela começa como um esforço de identificar estratégias discursivas específicas do cristianismo (qualquer forma de cristianismo) em ambientes “inóspitos” proporcionados pela midiatização.
Por “inóspito” não se lê necessariamente refutação, mas “deslocamento”: locais da ambiência que não são programados ou convidativos para manifestações religiosas.
O campo social “religião” foi escolhido porque se trata de instituição muito mais antiga que as modernas tecnologias de comunicação e, por conta disso, caracterizada por protocolos enraizados o suficiente para fazer frente, em eventuais contradições, aos protocolos da midiatização.
Religião é um fenômeno relevante para o processo – mas é, repetimos, por causa da resistência institucional a certos protocolos da mídia. O modelo de pesquisa que se servirá do esforço de Iniciação Científica deverá, portanto, ser igualmente promissor nas relações de política e midiatização, educação e midiatização, etc.
2.b Contrabando
Se é verdade que a midiatização afeta os campos sociais, parece improvável que todos absorvam tal influência de maneira uniforme. A solidez de cada campo e seus interesses conflitantes representa, em primeiro lugar, resistência a alguns protocolos e ações da midiatização; em segundo lugar, oferecem, eles também, diversos tipos de influência que redesenham as “formas tecnológicas de vida”, por definição sujeitas prioritariamente a movimentos tecno-socio-simbólicos.
As primeiras observações “selvagens” sugerem uma hipótese ainda mais interessante e um alargamento de propósitos a partir dela. A experiência de transmitir mensagens em outros ambientes parece ocorrer preferencialmente na forma de “contrabandos” individuais. Ou seja, não é um sistema que infere suas proposições em outros, pelo menos nas formas discursivas inicialmente observadas. Partamos da suposição que os campos não promovem intercâmbios relevantes porque sistemas não aceitam interferências discursivas radicais sem se transformarem em outra coisa. Trata-se de um limite hermenêutico: se um conjunto de idéias “estrangeiro” contamina um sistema, ele só pode sofrer uma transformação de reconhecimento – caso contrário, a interferência foi tão descartável quanto inócua. Nesse sentido (o da linguagem) os sistemas são mesmo impenetráveis.
O problema da linguagem é especialmente interessante aqui porque ele proporciona justificar a expressão “contrabando”. Ora, se os limites hoje são “borrados” ou “móveis”, talvez fosse improvável que uma expressão como essa pudesse ser utilizada. No entanto, reconhecemos esse ou aquele campo porque damos nome a eles. Esses nomes são as “cercas que firmam limite entre um ente, ator, campo e outros entes, atores, campos.
Portanto, ultrapassar esses limites não pode ser ação abstrata, inominada, “programada” pelos sistemas. Ele é ação concreta de atores individuais “com rosto” – pessoas que se valem de circunstâncias favoráveis (poder, oportunidade, acaso) para “transportar” uma mensagem para um ambiente “ilegal” ou “inóspito”.
Daí o alargamento da perspectiva. A questão do contrabando naturalmente leva a outros campos, não apenas do “embate” entre midiatização e religião.
Observáveis como a manifestação de atores individuais cristãos não podem ser vistos como objetos estanques de reputação consolidada. Estão em movimento, pois constroem significados à medida que são usados ou interpretados ou rearranjados pelos indivíduos que se deparam, escolhem, consomem esses produtos. Mas também é possível compreender isso como basicamente “descrever” a importância da circulação como lente privilegiada de leitura da midiatização. O que sugere ser realmente peculiar é o reconhecimento que, em casos semelhantes, o papel do indivíduo supera qualquer generalização, o que descarta análises de recepção, pelo menos no sentido clássico. Na verdade, o fato de focar nas estratégias do “usuário” (não autor ou consumidor) é mais uma questão de operação metodológica do que escuta das significações emergidas. A ideia é “rastrear” o movimento a partir das pistas que o usuário deixa nas suas estratégias de circulação.
O “contrabando” é uma espécie de obiter dicta: ele “entrega o jogo” e nos permite aceitar, talvez no único momento possível, a “intenção” em disputa na circulação. Se não podemos falar com segurança de “intenção” já que os discursos não pertencem ao controle do inconsciente, podemos pelo menos identificar as ações propositais que os discursos deflagradores insinuam.

2. Etapa metodológica
Uma etapa fundamental de tal pesquisa é reconhecer, no território acadêmico brasileiro, as inclinações de pesquisa no campo religião/mídia que possam, por ventura, dialogar com o esforço de se separar as estratégias institucionais das individuais – nestas últimas é que se pode vislumbrar com mais clareza, como está exposto, o esforço de “contrabando” de mensagens no interior da circulação na mídia.
Portanto, as tarefas do bolsista na primeira fase da pesquisa serão;
a) Identificar, através dos canais disponíveis, as linhas de pesquisa e eventuais trabalhos individuais nos últimos seis anos, em todo o território nacional, que tratem da relação mídia e religião;
b) Selecionar, organizar e categorizar, sob supervisão, a bibliografia utilizada nestes estudos;
c) Selecionar, enfim, as dissertações e teses cujo foco seja predominantemente comunicacional.
3. Resultados esperados para o bolsista
Cada fase da pesquisa representará a produção de um texto científico e sua apresentação/publicação nos eventos acadêmicos da área, além de eventuais contribuições na imprensa em forma de comentários ou artigos. Além disso, o objetivo principal é familiarizar o estudante com a importante etapa de identificação do “estado da arte” de seu tema, cujo caminho, inclusive, representa o reconhecimento do trabalho intelectual realizado nas diversas instituições de ensino superior brasileiras – o que o ajudará a descobrir sua própria vocação acadêmica. O trabalho também representa um esforço epistemológico que familiariza o bolsista com os debates mais atuais no constituição do campo acadêmico da Comunicação.


Referências
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